Plataforma de Litigância Climática no Brasil

A Plataforma de Litigância Climática no Brasil é uma base de dados desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Direito, Ambiente e Justiça no Antropoceno (JUMA) que reúne informações sobre litígios climáticos nos tribunais brasileiros. Para uma melhor compreensão sobre a classificação dos casos, acesse nossa metodologia e nossas publicações. Boa pesquisa!



Nome do Caso: Defensoria Pública do Estado de São Paulo vs. ITESP, Fundação Florestal e Estado de São Paulo (titulação de território quilombola e sobreposição com Unidade de Conservação)

Tipo de Ação

Ação Civil Pública (ACP)

Órgão de origem

Tribunal ou Juiz de Estado ou do Distrito Federal

Data de Distribuição

03/2014

Número de processo de origem

0000522-11.2014.8.26.0172

Estado de origem

São Paulo (SP)

Link para website de consulta do tribunal de origem

https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/open.do

Resumo

Trata-se de Ação Civil Pública (ACP) com pedido de tutela de urgência proposta pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPESP) em face da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP), Fundação para a Conservação e a Produção Florestal do Estado de São Paulo (Fundação Florestal) e Estado de São Paulo. Busca-se a anulação do Decreto Estadual que criou uma Unidade de Conservação no tocante à sua sobreposição à território quilombola. Coloca-se o racismo ambiental como grande impulsionador para o forte cenário de marginalização em que vive a Comunidade Quilombola de Bombas, que tem seu direito territorial negado em virtude de uma suposta incompatibilidade desses direitos em relação à tutela da biodiversidade local. Isso porque o território dessa comunidade se sobrepõe a uma Unidade de Conservação chamada Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR). Os requerentes argumentam que os povos quilombolas daquela região são protetores da natureza e possuem uma relação de dependência mútua com a natureza. Assim, requer-se o reconhecimento territorial quilombola; o levantamento fundiário, com desintrusão de eventuais terceiros; a revogação ou invalidade do Decreto Estadual 32.283/1958, apenas no tocante à incidência do parque sobre o território quilombola; a titulação do território quilombola; e a construção de estrada e acesso adequado à comunidade. Na petição inicial não há menção à questão climática, que é mencionada pela primeira vez no processo na sentença.

Em contestação a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGESP), em defesa dos réus, argumentou que (i) não haveria interesse de agir por parte dos membros do Quilombo de Bombas e de sua associação tendo em vista o processo de reconhecimento oficial em iminência; (ii) a ação violaria o principio constitucional e administrativo; (iii) a ação violaria as prerrogativas de presunção de legitimidade e veracidade dos atos administrativos impugnados; (iv) haveria impossibilidade de imposição de multas, que teriam sido calculadas de forma exorbitante, desproporcional e desmotivada. Sendo assim, requereu-se que a ação fosse julgada improcedente, cassando medidas liminares concedidas.

Foi proferida sentença que jugou procedente o pedido inicial em favor da Comunidade Quilombola de Bombas para reconhecer a invalidade material do Decreto 32.238/1958, que criou o PETAR, na parte em que se sobrepõe ao território quilombola. Afirmou-se a sua incompatibilidade com o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e a Convenção 169 da OIT, declarando a nulidade da afetação daquele território à Unidade de Conservação. A decisão abordou o  conceito de racismo ambiental no contexto da justiça climática, porém conclui-se que o caso é fruto da soma de fatores sociais, ambientais, históricos e legais, tendo em vista a própria trajetória “invisibilizada” dos quilombolas até o advento da Constituição. Ademais, afirmou-se tratar de uma relação entre comunidades tradicionais e meio ambiente não conflitiva e reconheceu-se a necessidade urgente de paralisação da ação humana desenfreada sobre ecossistemas a ponto de modificar condições climáticas que hoje garantem a sobrevivência da humanidade. Assim, além de reconhecer a invalidade do PETAR na parte em que se sobrepõe ao território quilombola, a sentença: (i) condenou o Estado de São Paulo e o ITESP a promoverem o levantamento fundiário atualizado, no prazo de 6 meses, e iniciar a regularização fundiária outorgando à comunidade o título de domínio; (ii) condenou-os a apresentarem o projeto de estrada de acesso, e um cronograma para sua execução, bem como a iniciar a obra em um ano, sob pena de multa; e (iii) determinou a vigência do regime de dupla afetação na Unidade, com gestão do território pela comunidade e Fundação Florestal, afirmando a necessidade de consulta prévia, segundo protocolos que deverão ser estabelecidos pela própria comunidade, inclusão no plano de manejo, instrumentos de gestão ambiental e observância, pelos réus, da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (Decreto Federal 11.786/2023).

Em apelação, a PGESP utilizou o argumento climático de forma contextual afirmando que as mudanças climáticas são uma das maiores ameaças globais enfrentadas pela humanidade e a importância de sumidouros no sequestro de carbono e redução do acúmulo de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Assim, defendeu-se a solução para enfrentar o desafio climático pode estar em conceitos simples, como a preservação e restauração das áreas verdes, incluindo florestas e coberturas vegetais. Com isso, afirmou-se que investir na conservação e no manejo sustentável das áreas verdes não é apenas uma questão ambiental, mas também uma estratégia inteligente para enfrentar os desafios climáticos e fortalecer a resiliência das comunidades (inclusive quilombolas). Portanto, buscou valer-se dessa argumentação para defender a importância do PETAR e requerer, principalmente, que: (i) seja reconhecida a incompetência da Justiça Estadual para a análise e julgamento do caso, dado o interesse da União, especificamente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), autarquia competente, na esfera federal, pela titulação dos territórios quilombolas e (ii) seja afastado o julgamento de inconstitucionalidade do Decreto Estadual 32.238/1958, que criou a Unidade de Conversavação. Alegou-se, dentre outro pontos, a lesão ao princípio da reserva legal, ao princípio da proibição do retrocesso ambiental e à norma que obriga o Estado a criar a Unidade de Conservação, afirmando-se a necessidade de uma ponderação de interesses no caso. 

A Fundação Florestal e a ITESP também apresentram apelação, mas sem mencionar a questão climática. A DPESP apresentou contrarrazões e os recursos aguardam julgamento.

Ver Mais

Polo ativo

  • Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPESP)

Tipo de polo ativo

  • Defensoria Pública

Polo passivo

  • Estado de São Paulo
  • Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP)
  • Fundação para a Conservação e a Produção Florestal do Estado de São Paulo (Fundação Florestal).

Tipo de polo passivo

  • Ente federativo
  • Órgãos da Administração Pública

Principais recursos

Apelação (PGESP - TJSP)

Principais normas mobilizadas

Biomas brasileiros

Mata Atlântica

Setores de emissão de Gases de Efeito Estufa(GEE)

Mudança de Uso da Terra e Florestas

Status

Em Andamento

Abordagem da justiça ambiental e/ou climática

Menção expressa

Alinhamento da demanda à proteção climática

Favorável

Abordagem do clima

Argumento contextual


Timeline do Caso

03/2014

Petição Inicial

10/2014

Contestação

12/2023

Sentença

03/2024

Apelação


Documentos do Caso


Tipo de Documento

Apelação

Origem

Fazenda Pública do Estado de São Paulo

Data

03/2024

Breve descrição

Requereu-se, principalmente, que: (i) seja reconhecida a incompetência da Justiça Estadual para a análise e julgamento do caso, dado o interesse da União, especialmente do INCRA e (ii) seja afastado o julgamento de inconstitucionalidade do Decreto Estadual 32.238/1958.

Arquivo disponível



Tipo de Documento

Sentença

Origem

Vara Única da Comarca de Eldorado do TJSP

Data

12/2023

Breve descrição

Julgou-se procedente o caso e (i) reconheceu a invalidade material do Decreto 32.238/1958 (que cria o PETAR) na parte em que se sobrepõe ao território quilombola; (ii) condenou o Estado de São Paulo e o ITESP a promoverem o levantamento fundiário atualizado e iniciar a regularização fundiária, outorgando à comunidade o título de domínio; (iii) condenou-os na obrigação de apresentarem projeto de estrada de acesso e cronograma de execução, e a iniciarem a obra em um ano, sob pena de multa; e (iv) determinou a vigência do regime de dupla afetação na Unidade, com gestão do território pela comunidade e Fundação Florestal, necessidade de consulta prévia, inclusão no plano de manejo e instrumentos de gestão ambiental.

Arquivo disponível



Tipo de Documento

Contestação

Origem

Fazenda Pública do Estado de São Paulo

Data

10/2014

Breve descrição

Requereu-se que a ação fosse julgada improcedente cassando medidas liminares concedidas.

Arquivo disponível



Tipo de Documento

Petição Inicial

Origem

Defensoria Pública do Estado de São Paulo

Data

03/2014

Breve descrição

Requer-se, em sede liminar, que seja (i) apresentado plano para construção de estrada de acesso à comunidade de Bombas, com efetiva participação de seus membros; e (ii) elaborado, em conjunto com a comunidade quilombola de Bombas, Plano Provisório de Gestão Compartilhada. Em sede definitiva, requer-se que (i) haja o reconhecimento oficial do território quilombola; (ii) o levantamento fundiário no território quilombola pleiteado, para desintrusão de eventuais ocupantes não-quilombolas; (iii) revogação ou invalidação do Decreto Estadual 32.283/1958, que criou o PETAR, apenas no tocante à sua incidência sobre o território quilombola de Bombas; (iv) a outorga de título coletivo à comunidade, em nome da Associação dos Remanescentes de Quilombo de Bombas; e (v) confirmação da tutela antecipada.

Arquivo disponível